A bem de São Paulo e de todos os paulistanos, fracassou a tentativa do presidente Lula da Silva e de seu antecessor, Jair Bolsonaro, de transformar a eleição para a Prefeitura da capital paulista em um descabido tira-teima da eleição presidencial de 2022. Salvo em alguns momentos nos quais temas nacionais, lamentavelmente, poluíram o debate local, as questões mais afeitas à vida na metrópole se impuseram ao longo da campanha. É tendo estas em vista que os eleitores devem comparecer às urnas neste domingo.
Foi debatendo sobre as condições do transporte público em São Paulo, a qualidade dos serviços de saúde e educação prestados pela Prefeitura, as ações de zeladoria urbana e, no que compete ao Município, sobre segurança pública que Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL) chegaram neste dia decisivo. E caminharam até aqui com os próprios pés, ora tropeçando em seus erros, ora avançando com seus acertos. A poucas horas da definição do nome do futuro prefeito de São Paulo, está claro que a unção de Bolsonaro e Lula a Nunes e Boulos, respectivamente, não alterou fundamentalmente a trajetória de ambas as campanhas.
Se a renhida polarização entre os dois principais líderes de massa da história recente do País teve pouca ou nenhuma influência no resultado eleitoral na maioria dos municípios brasileiros, em São Paulo, particularmente, a presença de Lula e Bolsonaro chegou a ser tóxica em não poucas ocasiões. Sobretudo a de Bolsonaro, que, mesmo ausente na maior parte do tempo, quando resolveu aparecer foi para constranger Nunes com sua egolatria e seu irrefreável apego aos próprios interesses político-eleitorais, como se viu há poucos dias.
No caso de Boulos, deve-se registrar que o psolista também chegou até aqui a despeito da ausência de Lula em sua campanha – voluntária ou forçada – e, principalmente, do desdém do diretório municipal do PT. Basta dizer que o partido de Lula, que sempre se mostrou reticente em abraçar de corpo e alma a campanha de Boulos, chegou a fazer um mea culpa por não ter lançado uma candidatura própria na capital paulista, tratando Boulos, na prática, já como um derrotado no momento em que o candidato, a rigor, ainda tem chance de ser eleito.
Para a cidade, entretanto, pouco importam os ruídos internos que a presença de Lula e Bolsonaro eventualmente tenha causado nas campanhas de Boulos e Nunes. É auspicioso que a eleição deste domingo tenha sido pautada, em boa medida, pelo futuro da cidade, pelos desejos de seus habitantes e pelos desafios da administração de uma metrópole como São Paulo. O pleito escapou de ser sequestrado pela polarização nacional que não raro interdita qualquer discussão racional acerca de temas concernentes ao melhor interesse público.
Como já sublinhamos neste espaço, o que Lula e Bolsonaro dizem ou deixem de dizer sobre a eleição para a Prefeitura de São Paulo não tapa um buraco sequer nas vias da cidade, não acende um só semáforo apagado ao primeiro pingo de chuva e tampouco abre novas vagas em creches ou escolas administradas pelo poder público.
Em tempos de discussões políticas inflamadas e por vezes estéreis, é digna de nota a maturidade do eleitorado paulistano ao fazer essa dissociação entre o interesse de Lula e Bolsonaro em manter viva a polarização que só beneficia os dois e os interesses dos cerca de 12 milhões de habitantes da maior e mais rica cidade do País. A um só tempo, essa maturidade demonstra o interesse maior dos eleitores por temas que afetam suas vidas diretamente e impõe a Nunes e Boulos o extraordinário desafio de se preparar para lidar com os complexos problemas da cidade que pretendem governar.
De acordo com as pesquisas, nem Nunes nem Boulos inspiram esperança nos eleitores por seus atributos pessoais ou pela exuberância de seus planos para governar São Paulo. Mas agora isso não importa. Afinal, quis a maioria dos paulistanos que a gestão da cidade a partir de 1.º de janeiro de 2025 coubesse a um dos dois candidatos. Que eles estejam à altura dessa escolha.
Estadão.