Se tem uma coisa que sempre será debatida entre os pais e responsáveis é o uso de dispositivos tecnológicos pelas crianças e adolescentes. Muito se fala em tempo de tela e o que permitir a eles, mas, além disso, já se perguntaram se o excesso disso pode afetar o cérebro dos pequenos?
Baixa qualidade do sono, má alimentação e impactos físicos e psicológicos são alguns dos problemas causados pelo uso desenfreado de telas, como TV, tablets, celulares e computadores. A tecnologia, muitas vezes, é uma aliada na criação dos filhos, mas o que muitos pais não sabem é que o uso sem equilíbrio pode prejudicar o desenvolvimento deles.
Por isso, para falar sobre como diminuir a exposição à tecnologia, a Dra. Rebeca Liebich Gusmão Gigante, neurologista da Unimed Campo Grande, e a pediatra da Unimed CG, Dra. Kamilla Amaral Gonçalves Moussa, falam sobre o assunto.
Queixa de consultório?
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
Não é uma queixa, porque muitos pais nem tem conhecimento de que a tela pode se tornar um problema para suas crianças. No dia a dia, na análise clínica, é algo que comecei a questionar, inclusive sobre o sono, a alimentação, em que circunstâncias a criança come e se tem acesso à tela antes de dormir.
É surpresa?
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
Por mais que seja um assunto que está em foco, a maioria não sabe que o uso das telas em casa está demasiado. Há um excesso do uso de tecnologias, sim, especialmente em um nível que chega a atrapalhar o sono e a rotina de alimentação.
Interferências no desenvolvimento cerebral
Dra. Rebeca Gigante – neurologista
Quando se abre a janela ao amanhecer, essa não é uma luz maléfica (diferente da luz azul, artificial, emitida pelos eletrônicos), até porque pela manhã o cérebro precisa deste “liberar” para que o ciclo circadiano funcione.
O ciclo circadiano funciona, basicamente da seguinte forma: “de dia preciso estar desperto, então a luz ativa a liberação hormonal para a manhã, que é o cortisol”, “já à noite é preciso dormir, então é necessária a liberação da melatonina, que o próprio corpo produz. Essa liberação é dependente do escuro, ou seja, se esse ciclo é quebrado vários problemas aparecem, que envolvem obesidade, insônia ou perda de rendimento”.
É importante pontuar que, nas crianças, essa perda de rendimento é em relação à escola, podendo haver também o comprometimento das aquisições. Na pediatria aquisição significa “começar a andar, falar e fazer as coisas competentes à idade”.
Recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
A SBP recomenda:
– Até 2 anos : sem telas, inclusive de forma passiva.
– De 2 a 5 anos: uma hora de tela por dia.
– De 6 a 11 anos: de uma a duas horas de tela por dia.
– De 11 a 18 anos: no máximo três horas de tela por dia.
*Quando falamos em telas inclui-se o videogame, sem contar que é recomendado não virar noites jogando, até porque há a liberação da dopamina, gerando a sensação da recompensa. São vários mecanismos cerebrais importantes envolvidos, o que pode acarretar a um “estrago” no pré-adolescente.
Dra. Rebeca Gigante – neurologista
Necessário pontuar que a dopamina é também a responsável por nos fazer viciar em algo. Ter a recompensa é normal, o problema é a quantidade. Estamos passando dos limites, tanto crianças como adultos.
Conexão real
Dra. Rebeca Gigante – neurologista
Tivemos um pós-pandemia onde tudo precisou ser on-line e ainda há um reflexo disso atualmente, onde, inclusive, temos falhas na relação presencial. Parece que em alguns momentos não há mais a conexão natural, e isso, para a criança e suas aquisições, gera prejuízos, como no desenvolvimento primário.
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
Com o período pós-pandêmico foi possível ver um atraso de fala nas crianças, porque elas aprendiam a falar vendo o outro ser humano falando. Tudo isso ocorreu devido a esse exagero de telas.
Brincar é preciso
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
Não só na fala, mas o desenvolvimento motor também foi comprometido por essa época, especialmente o equilíbrio e o motor fino. A falta do brincar, do descer para jogar bola, influenciou.
Vídeos curtos que não acabam
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
Hoje, nas redes sociais, os vídeos são curtinhos, havendo a necessidade de coisas curtas e, consequentemente, da recompensa de “um a mais”. Nesse ‘rol’ crianças e adolescentes estão sofrendo muito, com esse abuso das redes sociais, em especial com esses vídeos rápidos.
Brincar livre é desafio, mas necessário
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
O que os pais podem fazer para evitar que crianças e adolescentes tenham tanto tempo de telas? Começando pelos pais. Os pais de crianças pequenas precisam se desconectar um pouco, ter tempo de presença real com os filhos e, a partir daí, se propor a brincar ao ar livre (massinha, quebra-cabeça, entre outros). É um desafio imenso, mas as crianças estão a todo o momento imitando os pais. Afinal, os pais traduzem o mundo para as crianças.
É essencial os pais reduzirem os tempos de tela. O brincar livre é preciso, pois neste momento as crianças liberam a criatividade, a parte motora e a linguagem.
Ontem x Hoje
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
Os pais de hoje, quando crianças, não precisavam dos pais para brincar, porque tinham diversas pessoas com quem fazer isso. Hoje a história muda, pois nossos pequenos, em sua maioria, não têm com quem brincar. E diversos são os fatores que contribuem para isso: ambiente social foi transformado, trânsito, violência, número de filhos na família reduziu, núcleos sociais mudaram, entre outros.
Dra. Rebeca Gigante – neurologista
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o número de filhos em cada núcleo diminuiu, simultâneo a isso a relação entre primos também mudou.
Custa caro, mas vale à pena
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
Que os pais sempre se lembrem de que a maior missão é ser pai e mãe, e é preciso trazer isso para si. Muito vale um filho saudável, que vai se desenvolver bem, e isso custa caro, então dá trabalho, mas vale à pena.
Dicas
Dra. Kamilla Moussa – pediatra
O uso desenfreado de tecnologia pode afetar o cérebro das crianças, por isso:
– Estabeleça horários e limites para o uso de telas
– Comunique-se com o seu pequeno
– Mais diversão! Incentive brincadeiras ao ar livre que não incluam o uso de tecnologia
– Estimule o convívio social com outras crianças
Dra. Rebeca Gigante – neurologista
Tentem colocar em casa, perto das telas ou estruturas que levem às telas, coisas que são substituíveis, como jogos lúdicos, que, inclusive, podem ter a participação de todos da família. Ter horário fixo para dormir e acordar também são atitudes necessárias, incluindo aos fins de semana.
Para saber mais sobre o assunto acompanhe “COMO O EXCESSO DE TELAS AFETA O CÉREBRO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES?” no podcast Cuidar de Você, da Unimed Campo Grande. Clique aqui e acesse o podcast.