O que você faria se os médicos dissessem que seu bebê talvez só sobrevivesse por três dias? Foi após uma gestação absolutamente normal e parto cesariano sem intercorrências que essa informação em forma de sentença caiu como uma bomba sobre a economista, Junia Cristina Fernandes. Ela já era mãe de Pedro, diagnosticado com autismo severo, e acabava de dar luz à Maria Julia, que chegava ao mundo tendo partes do corpo sem o revestimento e a proteção da pele. O motivo, a mãe só soube mais tarde. Tratava-se de uma doença congênita, tão rara quanto cruel: Epidermólise Bolhosa Distrófica Recessiva. Passados três anos, no entanto, nasce A Borboleta Maju, livro de Junia que chega para celebrar o aniversário e a vida da filha, contando um pouco da sua trajetória marcada por luta, dor e também muitas conquistas.
Escrito a partir da perspectiva da menina, o livro é voltado para o público adulto, tem o selo da Páginas Editora e marca a estreia de Junia como escritora. De forma leve e quase lúdica, a mãe-autora revisita momentos marcantes – como o diagnóstico, o tratamento experimental e o transplante de medula óssea -, para falar de esperança, empatia e amor incondicional. “Eu quis me colocar na pele da minha filha para convidar as pessoas a passearem pelo nosso universo, conhecerem mais sobre a doença e, principalmente, para dizer a elas que nunca desistam dos seus sonhos”, afirma.
Casulos e sonhos – O título “A Borboleta Maju” é uma alusão a uma das principais características da epidermólise bolhosa. Crianças que nascem com E.B. são chamadas bebês-borboletas devido à pele extremamente frágil e a formação constante de bolhas que, com o tempo, chegam a comprometer a forma e função de partes do corpo, como unhas, dedos, pés e mãos. Mas borboletas são para voar – assim como os sonhos. Por isso, essa é uma história, sobretudo, de coragem, superação e engajamento. O livro conta sobre os inúmeros casulos em forma de hospital, os anjos disfarçados de profissionais da saúde, as batalhas para conscientização sobre a doença, mudar leis e buscar atendimento adequado a todos os pacientes de E.B, além do desejo mais genuíno de, enfim, poder levar uma vida normal numa casa vermelha com quarto azul.
Maju, como é carinhosamente chamada, é popular na mídia e nas redes sociais. Sua história, desde cedo, despertou a empatia e a solidariedade de celebridades, como a influencer, Bella Falconi, que assina o prefácio do livro. Quem também chancela a obra é Tatiana Dias Paulucci – enfermeira, mestre em Saúde Pública e especialista em Epidermologia Hospitalar, que conheceu Maria Júlia ainda bebê, quando ela veio transferida da maternidade de Pirapora, no Norte de Minas, para o Hospital das Clínicas da UFMG, em Belo Horizonte. Assim como uma legião de seguidores, Bella e Tatiana acompanham de perto todo susto, cada nova internação e a coleção de vitórias nesses três anos de vida da menina.
“Ainda vivemos um dia de cada vez, mas hoje temos muito mais a agradecer”, conta a mãe-autora, que no livro também relata sua fé e não se cansa de repetir, como num mantra, que ‘o Amor vence a dor’. Com a experiência materna de dois filhos especiais, Junia é estreante com os livros mas é daquelas pessoas que sabem colocar um pouco de leveza em tudo. Além de conduzir o leitor pelo olhar da filha, sua narrativa se articula em capítulos curtos e não lineares. Outra estratégia são as ilustrações de Délcio Almeida, feitas em nanquim e outras técnicas manipuladas digitalmente a partir de fotografias do acervo pessoal da família. Tudo isso traz à obra um tom de suavidade, sem deixar de lado a densidade e a complexidade do tema central: uma criança, de saúde extremamente frágil, com muita vontade de viver e uma mãe que não conhece a palavra impossível.