O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região manteve a condenação da Brasil Telecom Call Center S.A. ao pagamento de R$ 300 mil pelos danos causados à sociedade, em acórdão que confirmou o reconhecimento da prática de assédio moral organizacional contra os empregados da operadora no munícipio de Campo Grande, de forma usual e repetida.
A decisão colegiada se deu no julgamento de recurso ordinário interposto pela Brasil Telecom, que pretendia afastar sentença proferida pela 7ª Vara do Trabalho de Campo Grande em agosto do ano passado, quando foi fixada aquela indenização além de obrigações de fazer e de não-fazer visando à regularização do meio ambiente laboral. À época, o cálculo do dano moral coletivo teve como parâmetros a gravidade das ofensas resultantes da prática de assédio moral, a repetição e prolongamento de atos por vários anos, o elevado número de empregados – mais de 3,2 mil, bem como o porte econômico da empresa.
Neste recente julgamento, os desembargadores negaram, por maioria, o recurso no tópico referente ao dano moral coletivo e acolheram parcialmente os argumentos relativos às astreintes – multas impostas por condenação judicial, reduzindo o valor de R$ 10 mil para R$ 1 mil por infração e por trabalhador. A procuradora regional do Trabalho Simone Beatriz Assis de Rezende participou do julgamento, representando o Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS).
Investigação
Os primeiros relatos da ocorrência desse tipo de irregularidade no ambiente laboral da empresa aportaram no MPT-MS, em 2013, quando foi instaurado inquérito civil para apurar denúncia que apontava abuso de poder praticado por um supervisor.
No decorrer da investigação, o MPT-MS recebeu outras denúncias referentes a condutas compatíveis com o assédio moral e, diante dos supostos indícios de irregularidades nas dependências da Brasil Telecom, notificou ex-empregados para prestar esclarecimentos.
Mais adiante, inspeção realizada por auditores-fiscais do Trabalho na operadora resultou na lavratura de diversos autos de infração, dentre os quais dois guardavam relação direta com as denúncias em fase de averiguação.
Após audiências com representantes da empresa no intuito de firmar Termo de Ajustamento de Conduta, a operadora manifestou desinteresse no acordo, não restando alternativa ao Ministério Público do Trabalho senão o ajuizamento da ação para assegurar os direitos dos trabalhadores.
Instada a se manifestar na ação civil pública, a operadora refutou qualquer ilicitude, aduzindo que os depoimentos juntados são antigos e que atualmente ministra cursos, possui canal de denúncia e rede de agentes de ética. Porém, na contramão dessa defensiva, o sindicato laboral disse ter conhecimento de que a empresa comete “usual e repetidamente” assédio moral contra seus trabalhadores.
Ofensas à dignidade humana
Na fundamentação de sua peça processual, a procuradora do Trabalho Rosimara Delmoura Caldeira transcreveu trechos do histórico dos autos de infração e de depoimentos prestados pelos trabalhadores, que corroboram a posição do sindicato da categoria. Também juntou relatório apresentado pela empresa Qualisalva Emergências Médicas, prestadora de serviços à Brasil Telecom, que trouxe várias ocorrências relacionadas a crise de ansiedade em trabalhadores, entre julho e dezembro de 2019.
“Essas situações extremas (a ponto de precisar de atendimento médico de urgência) são apenas as que ocorreram no ambiente de trabalho, muitas mais ocorreram fora do ambiente laboral, motivadas pelas condições desgastantes a que estão submetidos os trabalhadores”, sublinhou Caldeira.
A procuradora ainda destacou a existência de diversas sentenças proferidas no âmbito de ações trabalhistas individuais, com o objetivo de retratar o histórico de práticas de assédio moral e de agressão verbal e física cometidas dentro da empresa. Em uma delas, a trabalhadora relata que sofria com o rigor excessivo por parte de sua chefia, consistente em cobranças de meta, ameaças de troca de horários de trabalho e despedida, além de limite no uso de sanitário para satisfazer necessidades fisiológicas e de obrigá-la a trabalhar, apesar de doença com atestado médico.
Ao analisar circunstâncias envolvendo casos concretos, Rosimara Caldeira sustentou que o assédio moral interpessoal e o assédio organizacional ocorrem simultaneamente, pois a forma com que a empresa está estruturada fomenta tanto um quanto o outro.
“A empresa ao negar amparo aos trabalhadores, deixando-os à mercê de mandos e desmandos dos supervisores, ofende os princípios elementares da relação jurídica, dentre os quais o da boa-fé objetiva e, portanto, atua como assediadora direta em concurso com os supervisores, avalizando e validando sua conduta, como se dela fosse”, concluiu, postulando nesse sentido o pagamento de indenização por dano moral coletivo, pela violação a interesses e direitos juridicamente relevantes para toda a sociedade, seja com finalidade pedagógica, para prevenir futuros ilícitos.
Fonte: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul