A empresa Carrefour Comércio e Indústria LTDA. foi condenada liminarmente pela 2ª Vara do Trabalho de Campo Grande ao cumprimento de diversas obrigações de fazer e não fazer, no intuito de coibir a continuidade de reiteradas e habituais situações caracterizadoras de assédio moral organizacional contra seus empregados, expondo-os a danos de ordem física e moral. As medidas deverão ser observadas de imediato, em todas as unidades do Carrefour no estado de Mato Grosso do Sul.
A decisão em tutela provisória atendeu a pedido formulado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em ação civil ajuizada no mês passado, após denúncia recebida pela instituição, acompanhada de matéria jornalística que mostra um vídeo gravado por cliente da rede Carrefour ao presenciar um empregado limpando o chão e sendo aparentemente humilhado pela gerente da filial localizada no Shopping Campo Grande.
Antes de mover o processo, o MPT instaurou um inquérito civil com a finalidade de apurar as evidências associadas à prática de assédio moral, tendo inclusive apresentado proposta de pactuação de um Termo de Ajuste de Conduta, mas a empresa não manifestou interesse em formalizar o acordo extrajudicial sob o argumento de que não praticava o assédio e teria efetuado a rescisão contratual da gerente que aparece no vídeo, uma semana depois da repercussão do caso nas redes sociais e na imprensa. Entretanto, conforme destacado no inquérito civil, o Carrefour promoveu a recontratação dessa gerente em outra empresa do mesmo grupo econômico, cerca de três meses depois.
Diante da negativa da empresa em firmar o acordo e para que se pudesse aprofundar na investigação da prática de assédio moral, o MPT realizou audiências telepresenciais com empregados e ex-empregados da unidade onde os fatos supostamente ocorreram. O vendedor exibido no vídeo foi um desses empregados ouvidos pelo MPT e contou que passou a ser vítima de chacota entre os colegas e que precisou pedir um afastamento médico, sem ter sido procurado pela empresa em nenhum momento.
No decorrer da investigação, foi identificada a existência de centenas de ações trabalhistas ajuizadas em face do Carrefour nas Varas do Trabalho de Mato Grosso do Sul, muitas delas retratando o histórico de práticas de assédio moral, de agressão verbal, de discriminação e de injúria racial cometidas dentro da empresa, com pedidos de indenização por danos morais.
Ofensas à dignidade humana
Na fundamentação de sua peça processual, o procurador do Trabalho Hiran Sebastião Meneghelli Filho descreve as ações da empresa e de seus prepostos.
“A par dos atos de assédio típicos, como gritos, xingamentos, pressão psicológica, exposição a situações humilhantes etc., há diversas ilicitudes paralelas que encerram um cenário de assédio moral organizacional que vai minando a autoestima, a autoconfiança e a autonomia dos trabalhadores, causando diversos malefícios à saúde física e, principalmente, mental desses empregados, a exemplo de longas jornadas laboradas sem registro de ponto, durante madrugadas inteiras, imposição da prática ilegal de venda casada como forma de valorização e aumento salarial, aumento do volume de trabalho por acúmulo de funções e outras irregularidades”, sustentou Hiran.
Decisão
Respaldado no farto acervo probatório que acompanha a ação do MPT, o juiz do Trabalho Valdir Aparecido Consalter Junior reconheceu, na decisão, que a empresa tinha por prática a conduta ilícita, com a reiteração de atos e o intuito deliberado de reduzir os trabalhadores. E acrescentou que o exercício do poder diretivo de forma abusiva “desvirtua a função social da empresa e viola o direito dos trabalhadores a um meio ambiente de trabalho hígido, além de malferir deveres éticos mais basilares do próprio contrato de trabalho”.
Ao concluir que o Carrefour não teria adotado providência mais enérgica e eficaz com o intuito de eliminar esses comportamentos antijurídicos, o magistrado determinou que a empresa coíba, de imediato, qualquer ato flagrante de assédio moral, com a promoção de apuração e punição dos responsáveis, sob pena de no valor de R$ 10 mil por trabalhador prejudicado e por constatação.
Além disso, o juiz Valdir Aparecido Consalter Junior ordenou que o Carrefour implemente meios eficazes de recebimento e investigação de denúncias e casos de assédio, com ampla divulgação aos trabalhadores dos canais de denúncias, realização de procedimentos de apuração adequados e escritos, promovendo a efetiva aplicação de punições, também sob pena de no valor de R$ 10 mil por trabalhador prejudicado e por constatação.
Por fim, o magistrado impôs ao réu a obrigação de não permitir, tolerar, ignorar ou deixar de agir frente a situações que possam caracterizar assédio moral, autoridade excessiva ou desproporcional, pressão psicológica, coação, intimidação, discriminação, perseguição ou mesmo isolamento e ausência de comunicação direta com o trabalhador assediado, bem como qualquer gesto, palavra, comportamento ou atitude que provoque constrangimento físico ou moral, praticados por parte de seus empregados, diretos ou terceirizados, que detenham poder hierárquico ou mesmo entre colegas de trabalho, sob pena de no valor de R$ 10 mil por trabalhador prejudicado e por constatação. A decisão é liminar e agora o processo segue seu curso normal com as fases de conciliação, instrução e julgamento.
MPT/MS.