Indígenas, analfabetos e jovens que se declaram do gênero masculino. Este é o perfil predominante dos trabalhadores resgatados em condições análogas à de escravo em Mato Grosso do Sul, segundo a última atualização do Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, desenvolvido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A ferramenta, online e gratuita (acesse aqui), fornece informações sobre as localidades de origem mais frequentes das vítimas, incluindo locais de nascimento e residência declarada, gênero, faixa etária e escolaridade, além dos setores mais frequentemente envolvidos na prática da escravidão moderna.
O intuito é que o repositório de informações apresente à sociedade a realidade do trabalho escravo em todo o Brasil e, assim, contribua, com o fortalecimento das ações e políticas públicas de prevenção e erradicação.
O Observatório aponta que, de 1995 a 2020, 2.835 pessoas foram resgatadas em condição análoga à de escravo, uma média de 109 resgatados por ano no Estado, todos eles na zona rural.
Destes, 56% declararam-se como indígenas, 20% como brancos, 15% como pardos, 6% amarelas e 3% como pretos. Quanto ao grau de escolaridade, 62% eram analfabetos. Predomina entre estas pessoas o gênero masculino, a maior parte delas na faixa etária dos 18 aos 24 anos. No entanto, cerca de 2,5% são crianças ou adolescentes, o que evidencia também algumas das piores formas de trabalho infantil.
Destacam-se os setores econômicos mais frequentemente envolvidos nos resgates: cultivo de cana-de-açúcar (2.003 trabalhadores), produção florestal (237) e criação de bovinos (193), informações que permitem identificar riscos específicos existentes em determinadas atividades e cadeias produtivas.
Brasilândia lidera o número de trabalhadores resgatados
O viés geográfico do trabalho escravo mostra que tanto os locais de naturalidade quanto os de residência dos trabalhadores resgatados são marcados por desigualdades de desenvolvimento humano, renda e inequidades de base identitária. São locais que costumam se caracterizar pela falta de oportunidades de emprego e renda, baixa oferta de postos de trabalho e vagas para ocupações que pagam salários baixos, com pouca ou nenhuma qualificação profissional ou educação formal.
Com pouco mais de 11,9 mil habitantes (dados do IBGE de 2020), o município de Brasilândia, divisa com o estado de São Paulo, registrou 1.011 resgates de 1995 a 2020 – uma média de 38,9 por ano – situação que coloca a cidade no topo do ranking de pessoas flagradas em condições degradantes de trabalho no estado.
Não houve resgates de trabalhadores que fossem naturais do município, e apenas dois deles declararam residir ali, demonstrando que a mão-de-obra é aliciada em outras regiões para laborar de maneira ilícita em fazendas da cidade.
Além de Brasilândia, chama atenção o número de resgates no município de Iguatemi (624, de 1995 a 2020) e Naviraí, que registrou 368 resgates no período. Na capital do Estado, Campo Grande, foi realizada uma média de 1,5 resgates de trabalhadores por ano entre 1995 e 2000, 40 no total.
Panorama nacional
Nos últimos 25 anos no Brasil, entre os municípios com maior frequência de resgates de trabalhadores explorados destacam-se São Félix do Xingu e Marabá, no Pará, Açailândia, no Maranhão, além dos municípios paraenses de Novo Repartimento e Rondon do Pará, todos com mais de 10 anos de incidência na série histórica.
Em 2020, 17% das vítimas foram resgatadas em atividades de produção florestal (florestas plantadas e nativas), 15% no cultivo do café e 10% na criação de bovinos, com grande concentração na área rural. Entre as atividades industriais e de serviços, tipicamente urbanas, destacam-se no mesmo período os resgates em setores como o comércio varejista (10%), montagem industrial e de estruturas metálicas (7%) e empreendimentos de construção e imobiliários (5%).
Quanto aos setores econômicos tipicamente rurais, as maiores reincidências em diferentes anos estão na criação de bovinos, na exploração de florestas nativas e plantadas e em vários cultivos tradicionais brasileiros (café, soja, cereais, cana-de-açúcar, algodão, cacau e outras frutas), todos com incidência em mais de 10 anos dos 25 da série histórica. Quanto às atividades urbanas, as maiores reincidências anuais ocorreram na construção civil e na confecção de peças de vestuário, também com mais de 10 anos de incidência na série de 25 anos. Há, ainda, persistente reincidência em setores como a mineração e a extração de pedra, areia e argila.
Denuncie
O trabalho escravo é um crime e uma grave violação dos direitos humanos. Milhares de pessoas, nas zonas urbanas e rurais, ainda são exploradas, por meio do trabalho forçado, da servidão por dívida, da submissão a condições degradantes de trabalho e de jornadas exaustivas. A prática é considerada uma das formas de tráfico de pessoas.
Denúncias sobre tráfico de pessoas e trabalho escravo podem ser feitas por meio dos seguintes canais:
App MPT Pardal (Android e IoS)
Disque 100 ou 180
Sobre o Observatório
O Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas é um dos cinco observatórios digitais da iniciativa SmartLab de Trabalho Decente, um laboratório multidisciplinar de gestão do conhecimento com foco na promoção do trabalho decente no Brasil.
Desde o seu lançamento, os cinco observatórios digitais da Iniciativa SmartLab contam com mais de meio milhão de visualizações de páginas, oriundas de mais de 74 países, consolidando-se como o maior repositório de informações e conhecimento sobre trabalho decente do Brasil.
A partir deste mês, além das instituições apoiadoras da iniciativa SmartLab, o MPT e a OIT contam com um importante e estratégico parceiro na gestão de estudos conjuntos e aprimoramentos contínuos do Observatório: a Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), vinculada à Secretaria Especial de Previdência e Trabalho (SEPRT), do Ministério da Economia.
Ministério Público do Trabalho | Procuradoria Regional do Trabalho da 24ª Região.