Mato Grosso do Sul mais que dobrou a captação de órgãos e tecidos no primeiro semestre de 2023. É o que apontam os números da Central Estadual de Transplantes da Secretaria de Estado de Saúde (SES), quando se comparam os dados do mesmo período do ano anterior.
Foram realizadas 18 captações de órgãos e tecidos. Número muito maior do que o registrado no mesmo período em 2022, quando foram somente oito.
Com relação aos transplantes, os números também apresentaram um crescimento no semestre: foram um de coração, dois de medula óssea autogênica, 14 de rim e 97 de córneas. Em 2022, no mesmo período, 3 de rim e 120 de córneas.
Numeros positivos para este Dia Nacional da Doação de Órgãos, a ser comemorado no próximo dia 27 de setembro, e que revelam um importante trabalho de bastidores. Para a coordenadora da Central, Claire Carmen Miozzo, os motivos para esse aumento são vários, entre eles a diminuição de pacientes com Covid. “E também, intensificamos cursos e treinamentos com equipes médicas nos hospitais, pois são nesses ambientes que ocorrem a morte encefálica”, explica.
Hospital Unimed Campo Grande – O hospital Unimed CG é credenciado pelo Ministério da Saúde desde o início de 2020 para realização de transplantes renais e, desde 2016, para a realização de transplante de osso, sendo a única instituição credenciada junto ao órgão. Em 2018, foi autorizado, também, a realizar a captação de órgãos e tecidos. Para atender uma demanda crescente e cada vez mais especializada, conta com a Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (CIHDOTT), responsável por fazer todo o atendimento. Um serviço que beneficia toda a sociedade e não apenas beneficiários do plano, pois os órgãos captados pela equipe na unidade hospitalar tiram pacientes da fila única da Central Nacional de Transplantes, do Ministério da Saúde. Essa rede tem apoio das Centrais Estaduais de Transplante.
Abrir um diálogo – A qualidade e agilidade do atendimento dessa Comissão do Hospital fez toda a diferença no que a enfermeira Fernanda Queiroz de Souza classificou de “pior dia da vida”. Nem essa frase curta e direta consegue resumir esse fatídico dia, quando ela ouviu do médico a informação sobre a morte encefálica da mãe. Entre todas as outras deliberações que precisaram ser agilizadas a partir daí, a enfermeira conta que a decisão por autorizar a doação dos órgãos foi uma das que tomou com mais serenidade. “A alegria de ter feito a vontade dela, que era o de dar oportunidade de viver para outras pessoas e seus familiares, não tem preço que nos pague”, afirma. “Era uma conversa corriqueira em família e sabíamos o desejo dela. Tínhamos essa discussão em casa, mesmo sem nunca esperar morrer ou perder alguém que tanto amamos. Mas, eu, minha mãe e irmão sabemos das vontades um do outro”.
Esse diálogo com a família e amigos – sobre a vontade e autorização para doar órgãos e tecidos – é fundamental para que o desejo seja respeitado perante a legislação brasileira. A lei 9.434/2007, regulamentada pelo decreto 9.175/2017, afirma que a decisão final é da família (a norma exige autorização de cônjuge ou parente maior de idade, até o segundo grau).
“É fundamental que as pessoas não só se conscientizem sobre a importância da doação de órgãos, mas que tenham uma conversa aberta com seus familiares sobre esse desejo. Esse ato é capaz de mudar a vida de alguém”, pontua Dra. Giovanna Padoa de Menezes, coordenadora da CIHDOTT do Hospital Unimed Campo Grande. A partir do “sim”, a corrida é contra o tempo!
Dúvidas – Para ser um doador de órgãos e tecidos é necessário ser um cidadão juridicamente capaz, e estar em condições de doar o órgão ou tecido sem comprometer a própria saúde ou as aptidões vitais. Para a doação em vida, é necessário certificar-se também que o organismo do doador irá continuar funcionando em perfeitas condições.
O tema ainda é envolto a muitas perguntas e, por isso, a CIHDOTT esclarece algumas delas:
– reconstituição do corpo – a doação de órgãos após a morte não viola o corpo do doador. Sua aparência física é preservada e a pessoa é respeitada nos devidos termos clínicos e humanos. O corpo é reconstituído após a cirurgia de retirada dos órgãos, deixando-o o mais próximo da aparência natural possível.
– doação em vida – ela é permitida entre parentes até quarto grau ou cônjuge, após avaliação médica detalhada.
– transplante de medula óssea – é preciso total compatibilidade entre doador e receptor.
– Quais órgãos podem ser doados após morte encefálica?- Coração, pulmões, fígado, pâncreas, rins e o intestino delgado. Também pode-se doar tecidos como medula óssea, córnea, ossos, pele e valva cardíaca.
– Quais órgãos podem ser doados em vida? – Rim, parte do fígado e parte do pulmão.
Tempo – Para a enfermeira Fernanda Queiroz de Souza, lidar com as dúvidas que surgiram por parte de alguns familiares fez parte do processo, mas não a detiveram. “Fica a saudade, mas sei que ela está feliz e concordou com as nossas escolhas que foram dentro de tudo o que ela tanto ensinou e aplicou em vida. Ela sempre acreditou que poderia fazer outras famílias felizes e sei que neste momento outros lares estão tendo a chance de abraçarem seus entes mais aliviados e, quiçá, por muito mais tempo.”