Por: Fernando Valente Pimentel*
É urgente que o Governo Federal estabeleça igualdade de condições tributárias entre empresas nacionais e as plataformas internacionais de e-commerce, para que a concorrência seja justa e equilibrada. Nesse sentido, há duas alternativas: revogar a isenção de 50 dólares do Imposto de Importação para mercadorias que ingressem no mercado interno; ou conceder isenções equivalentes aos produtos fabricados e comercializados no País.
De uma maneira ou de outra, é necessário corrigir essa distorção, pois o benefício concedido às estrangeiras gerou, e gera danosa concorrência contra a indústria e o varejo brasileiro, principalmente nos setores têxtil e de confecção. Tais segmentos empregam formalmente 1,3 milhão de pessoas, sendo cerca de 70% ocupados por mulheres. Quanto ao porte das empresas mais de 80% são pequenas e médias de um total de 23 mil com 5 ou mais funcionários, presentes em todo o território nacional.
Agravadas por outros conhecidos fatores que limitam a produtividade da indústria nacional, as condições desiguais geradas por esse cenário pressionam o setor têxtil e de confecção, que registrou perda de mais de 20 mil empregos formais em 2023. O preocupante indicador resulta, em grande parte, queda de 7% na produção de vestuário e de 4,6% nas vendas do varejo na comparação com 2022.
Infelizmente, o empresário que observa os primeiros passos deste 2024 não tem motivo para comemorar. Em janeiro, as importações de produtos têxteis e de confecção cresceram 26,5% em relação ao mesmo mês do ano passado, e competidores com apetite para avançar sobre o mercado brasileiro parecem não poupar esforços para ampliar sua capacidade produtiva. Exemplos de empresas internacionais de e-commerce avançando no mercado não faltam.
Entre os maiores vendedores mundiais de peças de vestuário estão os países asiáticos que continuam a realizar elevados investimentos em sua indústria com suporte de seus governos. Diante das mudanças na geopolítica estamos vendo movimentos de busca de novos mercados para escoar seus excedentes produtivos, e o nosso país é um dos alvos desta ofensiva.
Em contrapartida, no Brasil, a desigualdade na taxação abrange gama muito elevada do volume de produtos comercializados, pois o ticket médio nas vendas do segmento de moda ao consumidor final é inferior ao valor em reais equivalente aos 50 dólares da isenção concedida às empresas estrangeiras.
Para se entender melhor a questão, o Governo Federal instituiu, em 30 de junho de 2023, por meio da Instrução Normativa 2.146/2023, o Programa Remessa Conforme, que estabeleceu uma série de boas práticas para a entrada de mercadorias no País, estimulando a correção e a probidade. Também foi definida a cobrança de 17% do ICMS para esses ingressos, algo muito positivo apesar dessa alíquota estar abaixo da aplicada aos produtos brasileiros em vários estados. Não sabermos se está sendo devidamente cobrada e recolhida aos cofres públicos.
Porém, o Ministério da Fazenda publicou, na mesma data, a Portaria 612/2023, concedendo a isenção de 50 dólares para as empresas internacionais de e-commerce que adotem as diretrizes do Remessa Conforme. Ou seja, criou-se uma autêntica recompensa tributária para as plataformas que trabalharem com o devido compliance.
No entanto, as indústrias e varejistas brasileiros, sejam de pequeno, médio ou grande porte, que estão em conformidade com a legislação, recolhendo tributos sobre toda e qualquer venda realizada, sem benefício algum, devem pagar impostos e seguir as regras fiscais. Criou-se, assim, uma efetiva concorrência desigual, pois as condições diferentes ocasionam prejuízo grave às empresas nacionais e aos empreendedores e trabalhadores dos setores afetados. Enquanto as brasileiras são taxadas sobre todas as vendas destinada ao mercado interno por tributos da União e dos estados as plataformas internacionais de e-commerce estão isentas até 50 dólares dos impostos federais, incluindo o de importação.
Outra desigualdade nociva diz respeito às regras de etiquetagem e características técnicas dos produtos. As empresas nacionais, como deve mesmo ser, estão obrigadas a cumprir uma série de exigências, que, pelo menos por enquanto, não são fiscalizadas nos itens importados por meio das plataformas eletrônicas estrangeiras. Isso também implica riscos para os consumidores quanto à qualidade e segurança das mercadorias.
Cabe ressalvar que todos os negócios são muito bem-vindos, num regime global de competição saudável. Entretanto, é fundamental que todos tenham o mesmo tratamento tributário e de fiscalização para que a competição seja justa, aderente aos preceitos do livre mercado e atenda aos legítimos interesses e anseios dos consumidores.
Por isso, é urgente restabelecer a isonomia tributária. Ou será que daremos o “empurrão” para que potências produtivas e comerciais acumulem bilionárias cifras com suas exportações enquanto nós faremos a exportação de emprego e renda para outros países?
*Fernando Valente Pimentel é diretor-superintendente e presidente emérito da Abit.