Pandemia, segundo o dicionário Aurélio, significa enfermidade epidêmica amplamente disseminada. Conforme explica a Defensora Pública Renata Camila Correa Bravim, “se considerarmos que a violência contra a mulher está presente nos mais diversos contextos sociais e atinge mulheres de todo o mundo, podemos afirmar que é sim uma pandemia e deve ser duramente combatida”.
Com a necessidade de distanciamento social, muitas mulheres ficaram longe das famílias e das redes de apoio, o que trouxe consequências na saúde mental e também o aumento da violência doméstica.
De acordo com dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMDH) a quantidade de denúncias de violência contra a mulher recebidas em abril de 2020 pelo canal 180 subiu quase 40% em relação ao mesmo mês em 2019.
O Nudem (Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher) aponta que os atendimentos diminuíram frente a Defensoria Pública. Em 2019 foram realizados 5.700 atendimentos, em 2020 cerca de 3.800 e até 30 de junho desse ano um pouco mais de 1500 casos atendidos. Mas não se pode considerar essa redução como algo bom ou ruim tendo em vista a dificuldade de acesso das mulheres para as formas de denúncias e contatos.
“As notícias comprovam que os registros de violência através dos números 190 ou 180 aumentaram em razão da pandemia, que infelizmente contribuiu muito para o aumento do número de casos de violência doméstica, em razão do maior tempo que o agressor passa com a vítima no ambiente doméstico, devido ao isolamento social. Nesse contexto, além de ficar mais suscetível de sofrer violência, há também casos em que a mulher, muitas vezes, fica impossibilitada de denunciar o agressor, por passar mais tempo na presença dele”, aponta a defensora Pública Renata Bravim.
Raiz do problema
Assim como o preconceito, a desigualdade e todos os tipos de violência, a raiz do problema pode estar ligada a cultura patriarcal. “A violência, em especial a doméstica, está enraizada na sociedade por causa da predominância da cultura patriarcal que coloca os homens nos espaços de poder. Essa cultura que trata a mulher com desigualdade, que subjuga a mulher pelo seu gênero é a principal causa da violência doméstica”, opina a Dra. Renata Bravim.
Ainda de acordo com a Defensora Pública, o Estado deve promover políticas públicas de conscientização e educação da população em geral de forma a desconstruir essa cultura patriarcal. Além disso, é importante que o tema também seja apresentado às crianças dentro de casa. “Entendo que a forma mais eficaz para ensinar as nossas crianças, é tentar dar o exemplo dentro de casa. Se os adultos tentam desconstruir o machismo, ensinando desde cedo para as crianças que homens e mulheres são iguais, muito provavelmente elas não vão cometer violência no futuro. Claro, julgo muito importante também o trabalho de conscientização e educação em direito nas escolas, mas a principal forma de educação vem do exemplo visto e vivido em casa”.
Papel da Defensoria Pública
A Defensoria Pública exerce um papel primordial nos casos de violência doméstica, pois é uma instituição que pode concretizar as formas de prevenção e repressão desse tipo de situação, podendo atuar de diversas maneiras, como pedir medidas protetivas em favor da vítima, resguardar os seus direitos promovendo ações de divórcio, dissolução de união estável, guarda de filhos e até mesmo encaminhar a mulher para a rede de atendimento (assistência social, saúde, habitação, trabalho, etc.).
“Aqui em Corumbá, por exemplo, atendemos os mais diversos casos e os mais comuns são ameaça e lesão corporal. Existe muita procura de mulheres que viveram a violência, ou ainda vivem, e recorrem à Defensoria Pública para propor ação de divórcio, alimentos, partilha de bens, guarda de filhos, entre outros. Há casos em que algumas mulheres, quando não conseguem registrar Boletim de Ocorrência, procuram a Defensoria Pública também para fazer pedido de medida protetiva de urgência contra o agressor”, explica a Dra. Renata Bravim.
Como denunciar
Muitos relacionamentos quando se tornam abusivos e violentos podem levar ao feminicídio. É importante que a mulher se atente e peça auxílio ao sair de uma relação desse tipo. Seja no trabalho, para os amigos, família, rede de atendimento, no sistema de saúde, assistencial, delegacias, sistema judiciário, Defensoria Pública, entre outros órgãos.
“Quero que as mulheres saibam que elas não estão sozinhas na luta contra a violência doméstica. Existe uma rede de apoio que pode as acolher, orientar e ajudar a denunciar. A Defensoria Pública faz parte dessa rede de apoio e pode te ajudar, mulher! Não se cale! Denuncie! Procure a ajuda da Defensoria Pública da sua cidade”, destaca Renata.
É importante ressaltar também a participação de terceiros para informar sobre alguma violência, tendo em vista que tal situação não se trata de mera briga de casal ou de uma situação particular que só afeta a mulher violentada, mas que, na verdade, é um problema de toda a sociedade e a população é responsável por essa luta pela igualdade.
Conforme explica Defensora Pública e Coordenadora do Nudem, Thaís Dominato, a violência contra a mulher traz impactos negativos para o sistema de saúde, para a economia, entre outros setores. Por isso, em briga de marido e mulher, pode-se meter a colher sim.
“Nesse momento de pandemia, observamos que se a mulher em situação de violência doméstica encontra-se obrigatoriamente em casa com o agressor, nós, vizinhos (as) também estamos mais em casa e devemos ficar mais atentos aos gritos, pedidos de socorro, barulhos de coisas sendo quebradas, etc. Podemos, por exemplo, entrar em contato diariamente com quem desconfiamos estar em situação de violência, colocando-nos à disposição para sermos rede de apoio e também é nossa obrigação denunciar. Se eu sei que uma vizinha está sendo violentada de alguma forma eu posso ligar para o 180, a denúncia, aliás, pode ser anônima. Podemos e devemos, portanto, contribuir para evitar tragédias maiores”, afirma e finaliza a Defensora Pública Thaís Dominato.
Assessoria.