Morte. O processo de luto é amplamente reconhecido como uma etapa da qual ninguém escapa, uma experiência humana universal. Apesar disso, uma pesquisa do Sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil (Sincep) provou que, para os brasileiros, a morte (e tudo o que lhe envolve) ainda é um assunto evitado nas conversas. 74% dos entrevistados, numa amostragem de mil pessoas, não falam sobre ela cotidianamente. Os brasileiros a associam também a sentimentos difíceis, como tristeza (63%), dor (55%), saudade (55%), sofrimento (51%) e medo (44%). Somente uma pequena parcela faz relação com sentimentos que não estão no campo da angústia, como aceitação (26%) e libertação (19%). A morte seria, assim, não um conceito, mas um conjunto de sentimentos “ruins”.
Um outro indicador pode apontar o porquê a relação com esse tema é tão perturbadora. O Índice de Qualidade de Morte, publicado pela consultoria britânica Economist Intelligence, mostrou que o Brasil ocupa a 42ª colocação entre 80 países. Nele, são considerados acesso a analgésicos, equipes de saúde multidisciplinar e o próprio tratamento da morte como assunto, além de indicadores quantitativos, como taxas de expectativa de vida e de porcentagem do PIB gasta em saúde, e qualitativos, baseados na avaliação individual de cada país em quesitos como conscientização pública sobre serviços e tratamentos disponíveis a pessoas no fim de suas vidas e disponibilidade de remédios e de paliativos.
Fases do Luto – A ciência já sabe que o luto afeta a saúde física e mental das pessoas. Dor no peito, sudorese, tremedeira e fraqueza são alguns sintomas físicos que as pessoas sentem que interferem no dia a dia. Mas são os sintomas psicológicos que podem impactar a vida e inabilitar a convivência social e profissional. Nos casos das perdas repentinas, o choque pode ser ainda maior. A psicóloga hospitalar do Hospital Unimed Campo Grande, Selma Lúcia da Costa Xavier, explica que as fases do luto mais conhecidas são a negação, a raiva, a barganha, a depressão e a aceitação, mas alerta que cada um vive seu processo de forma individual e único. “Os aspectos emocionais mais comuns nesse contexto são o sofrimento com sentimento de culpa, raiva, sensações de desamparo, abandono, rejeição, solidão, além da fragmentação de tudo o que era conhecido, ou seja, a pessoa estranha por completo aquilo que parecia ser conhecido”, explica. “Por ser uma morte repentina, é demandada muita energia psíquica para a elaboração do luto, chegando em algumas obras, a denominar o enlutado como ‘sobrevivente´”.
Para o psiquiatra da Unimed Campo Grande Marcos Estevão dos Santos Moura, a preocupação dos familiares deve ser com relação ao luto patológico, um tipo de transtorno mental. “Enquanto o chamado ´luto normal´ demanda um ombro amigo, o patológico precisa de intervenção psicológica e, quem sabe, medicamentosa”, alerta.
O psiquiatra afirma que o risco é que essa dor, esse sentimento, se transforme em um luto patológico, em uma doença como depressão, em uma situação onde o indivíduo perca o desempenho funcional, não conseguindo agir como antes. Apesar da literatura afirmar que a partir dos seis meses até dois anos, a pessoa já elabora melhor o luto, Marcos Estevão explica que não há um critério quantitativo para esse assunto. “Nas perdas repentinas o processo é mais complexo porque há o elemento surpresa e o enlutado tenta racionalizar e entender o que aconteceu para aliviar a dor”.
Tirar do foco – Para desfocar dos sentimentos negativos e realmente ser um apoio eficaz, a psicóloga Selma Lúcia afirma que ocupar a mente com projetos que o enlutado goste, terapia e passeios podem ajudar. Porém, não há ‘receita de bolo’, garante. Para quem quer saber como ajudar, ela recomenda: “falem sem medo sobre as lembranças da pessoa querida, não tenham medo de deixar a pessoa viva dentro de vocês, se isso não machucar ainda mais a pessoa. Utilize essa fase como um momento de autoconhecimento e autocuidado”.