Pressionado pela queda de popularidade, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu na tarde desta terça-feira, 25, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, deflagrando a reforma no primeiro escalão do governo. Para comandar a Saúde, que tem um orçamento de R$ 239,7 bilhões, Lula escolheu o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT). A ideia é ter um perfil mais político no ministério.
Com as mudanças, que continuarão nos próximos dias, o presidente tenta impor um freio de arrumação na segunda metade de seu mandato para estancar o desgaste e se preparar para 2026, quando ele pretende disputar a reeleição. O Ministério da Saúde é uma das principais apostas de Lula para alavancar o governo com programas emblemáticos, como o Farmácia Popular.
Além disso, ao deslocar Padilha, que cuidava da articulação política do governo, Lula abre espaço para uma nova troca justamente na área que trata da difícil relação do Palácio do Planalto com o Congresso, agravada por causa do impasse em torno do pagamento das emendas parlamentares.
O mais cotado para a cadeira ocupada pelo ministro é o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), que foi chamado nesta terça-feira para uma conversa com Lula. Caso a ida de Guimarães para o núcleo duro do governo se confirme, a chamada “cozinha do Planalto” continuará nas mãos do PT.
A não ser que haja uma mudança de última hora, a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, deve comandar a Secretaria-Geral da Presidência. No Planalto, o único ministro não filiado ao PT é o publicitário Sidônio Palmeira, que em 2022 foi marqueteiro da campanha de Lula e desde janeiro está à frente da Secretaria de Comunicação Social (Secom).
Nísia é a terceira mulher a deixar a Esplanada, reduzindo a presença feminina na equipe a nove dos 38 integrantes do Ministério. Antes dela foram Ana Moser (Esporte) e Daniela Carneiro (Turismo). Em 2023, Lula também demitiu a então presidente da Caixa Maria Rita Serrano, entregando a direção do banco para um aliado do Centrão, que também ficou com Esporte. Cida Gonçalves (PT), atual ministra das Mulheres, é outro nome que deve sair na reforma planejada pelo presidente.
Desde o início do governo, o Centrão reivindicava o Ministério da Saúde, mas Lula não atendeu o grupo. A portas fechadas, o presidente sempre disse que a pasta é estratégica para a sua gestão.
A demissão de Nísia, porém, já era esperada e ocorre após semanas de “fritura” no cargo. Nesse período, o que mais a incomodou foi o silêncio de Lula sobre o fogo “amigo”. Sem novas marcas em seu terceiro mandato, o presidente queria que ela acelerasse o programa Mais Acesso a Especialistas. O plano foi lançado em abril do ano passado, com o objetivo de reduzir o tempo de espera por cirurgias, exames e tratamentos no Sistema Único de Saúde (SUS), mas ainda não conseguiu chegar a todas as regiões do País. Agora, até mesmo o nome do programa, considerado burocrático e sem apelo popular, vai mudar.
Na manhã desta terça, Nísia participou da última cerimônia no Planalto, com a presença de Lula. Ela assinou portarias referentes à produção de vacinas contra dengue, influenza H5N8, vírus sincicial respiratório (VSR) e também ampliação do fornecimento de insulina pelo SUS. Fez um longo discurso, em tom de despedida, foi ovacionada pela plateia e agradeceu vários integrantes de sua equipe.
A solenidade foi marcada por um clima de constrangimento, com Lula olhando o relógio a todo instante. Nísia pretendia pedir para falar com ele, mas, uma hora e meia depois, o próprio presidente a chamou para uma conversa reservada em seu gabinete, no terceiro andar do Planalto. O Estadão/Broadcast apurou que Lula lamentou, mas disse a ela que precisaria do cargo. Mais tarde, ele também se reuniu com Padilha.
Médico infectologista, Padilha já foi ministro da Saúde no governo de Dilma Rousseff, de 2011 a 2014, e foi um dos criadores do programa Mais Médicos. Deputado federal licenciado, ele se comprometeu com Lula a não deixar o governo no fim de março do ano que vem para disputar nova eleição à Câmara. Este é o prazo dado pela Justiça Eleitoral para que ocupantes de cargos públicos interessados em participar da campanha entreguem seus postos.
No ano passado, Padilha chegou a ter duros embates com o então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que o chamou de “incompetente”. Mesmo com a eleição de Hugo Motta (Republicanos-PB) para o comando da Câmara, Lula avaliava que era preciso trocar o interlocutor político com o Congresso porque Padilha estava desgastado na função. O ministro é aliado do titular da Fazenda, Fernando Haddad. De 2015 a 2016, quando Haddad era prefeito de São Paulo, Padilha foi secretário municipal da Saúde.
Em nota, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência informou que a posse de Padilha ocorrerá no dia 6 de março. “O presidente agradeceu à ministra (Nísia) pelo trabalho e dedicação à frente do ministério”, destacou o breve comunicado sobre a troca na Saúde.
Nas redes sociais, Padilha disse ter “profunda admiração e carinho” por Nísia, a quem chamou de “amiga”. Ex-presidente da Fiocruz, ela não é filiada ao PT, mas próxima do partido. Foi indicada pelo ministro para o cargo e, como não integrava nenhum partido, era da “cota pessoal” de Lula.
“Símbolo de compromisso e seriedade à frente da Fiocruz e do Ministério da Saúde, Nísia deixa um legado de reconstrução do SUS, após anos de gestões negacionistas, que nos custaram centenas de milhares de vidas”, escreveu Padilha, numa referência governo de Jair Bolsonaro. “Nessa gestão, tivemos de lidar com o desafio de implementar uma verdadeira reabilitação das relações institucionais no Estado brasileiro, após quatro anos de um governo que tinha o projeto criminoso de destruir a democracia e fabricar conflitos”, completou o novo ministro da Saúde, que agradeceu até mesmo o desafeto Lira na postagem.
Estadão.