Na semana de apresentação do Orçamento de 2025 e em meio a promessas de revisão de despesas, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) propôs quadruplicar o gasto com o programa Auxílio Gás, que será rebatizado de Gás para Todos.
O desembolso deve saltar dos atuais R$ 3,4 bilhões para cerca de R$ 5 bilhões em 2025 e alcançará R$ 13,6 bilhões em 2026 – ano de eleição presidencial, segundo informou o Ministério de Minas e Energia (MME).
A política pública, que financia a compra do gás de cozinha a pessoas de baixa renda, também terá o seu alcance potencializado: as 5,6 milhões de famílias atendidas atualmente saltarão para 20,8 milhões, nas projeções do governo. Hoje, praticamente metade dos beneficiários reside no Nordeste, e a maior parte é do sexo feminino.
O anúncio do projeto de lei, que agora será analisado pelo Congresso Nacional, foi feito nesta segunda-feira, 26, pelo ministro Alexandre Silveira, titular do MME, ao lado de Lula e da primeira-dama Janja da Silva – que foi citada no discurso.
“Estamos atendendo aos objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU. Vamos impulsionar o cozimento limpo e a substituição da lenha, tão defendido pela nossa companheira Janja”, disse Silveira durante cerimônia na sede da pasta.
O projeto de lei também determina que a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) estabeleça um teto para o preço do botijão por região para os consumidores do programa.
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Eles deverão se inscrever num aplicativo que está sendo desenvolvido pela Caixa. As revendedoras privadas, interessadas em participar, também terão de se inscrever. Segundo o secretário de Petróleo e Gás do MME, Pietro Mendes, as revendedoras vão receber diretamente do governo.
Hoje, o Auxílio Gás – R$ 102, pagos bimestralmente – é depositado na conta do beneficiário do Bolsa Família, mas nem todo o público atendido pelo programa recebe. A ideia do governo é que todos possam estar aptos a receber o benefício em 2026, último ano do mandato de Lula. O presidente e seus auxiliares têm dito que ele deverá tentar a reeleição.
“Vamos buscar dentro da formulação de plataforma que a Caixa está desenvolvendo o melhor custo-benefício para o consumidor, para evitar, pelo menos nesses 20 milhões de famílias, esse inadequado ganho em potencial especulativo da distribuição”, disse Silveira.
Na apresentação do programa, o presidente Lula defendeu que o gás seja “instrumento da cesta básica” e afirmou que a população não consegue pagar R$ 140 pelo botijão, enquanto o produto sai da Petrobras por R$ 36.
Fundo do pré-sal como fonte de compensação preocupa
Segundo Silveira, o aumento bilionário de gastos será financiado com recursos do Fundo Social do Pré-Sal, que é vinculado à Presidência da República. Ele é abastecido com valores arrecadados nas licitações de contratos de partilha de produção no pré-sal, parte dos royalties que cabem à União e receitas da comercialização de petróleo e gás natural e é direcionado prioritariamente para despesas com educação.
O ex-secretário do Tesouro Nacional e head de macroeconomia do ASA, Jeferson Bittencourt, alerta, porém, para as determinações da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
O economista cita o artigo 17 da LRF, que determina que a criação ou aumento de despesas obrigatórias de caráter continuado tenham estimativa de custo, demonstrem que não afetarão as metas fiscais e tenham os efeitos financeiros compensados por elevação permanente de receita ou redução também permanente de despesa.
Atualmente, o Auxílio Gás é considerado uma despesa discricionária – ou seja, não obrigatória. Bittencourt pondera, porém, que caso o programa passe a garantir o produto (botijão) ou uma subvenção (ajuda financeira para comprar o gás) a quem atender certos requisitos, com o governo prevendo uma execução por período superior a dois exercícios, a despesa se tornará obrigatória, de caráter continuado.
“Neste caso, não adianta o governo falar que o recurso do Fundo Social vai ser ampliado, porque o Brasil deve produzir mais petróleo nos próximos anos e que essa será a compensação dessa despesa”, afirma Bittencourt.
“A LRF é clara em dizer o que é considerado aumento permanente de receita. Nessa lista, estão: elevação de alíquota, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributos. Ponto”, diz o economista. “Ou seja, precisa ser uma fonte nova, para não gerar desequilíbrio fiscal.”
O crescimento das despesas obrigatórias é um dos principais desafios fiscais da atual gestão. Como mostrou reportagem do Estadão, essas despesas crescem em ritmo superior ao teto do arcabouço fiscal – nova regra para controle das contas públicas –e, com isso, consomem fatia cada vez maior do bolo do Orçamento, “espremendo” as outras despesas.
No limite, avaliam especialistas, haverá o rompimento do teto ou a paralisação da máquina pública. Ciente desse cenário e pressionada pelos agentes do mercado, a equipe econômica vem adotando medidas de revisão de gastos com base, principalmente, no combate a fraudes e no pente-fino em cadastros.
Especialistas em contas públicas alertam, porém, que essas medidas mais paliativas só darão alívio no curto prazo e que o governo terá de adotar ações estruturais, como a desvinculação de benefícios do salário mínimo e a revisão dos pisos da saúde e educação, se quiser manter vivo o arcabouço a partir de 2027.
Estadão Conteúdo.