“As áreas úmidas têm a importância para os seres humanos porque ela faz parte do ciclo da água – algo essencial para a manutenção da vida no planeta”. É dessa forma, direta e clara, tal como o líquido que brota de uma nascente, que uma das maiores especialistas no assunto do Brasil, a Drª Cátia Nunes da Cunha, resume o elevado grau de importância dessas áreas para a garantia da biodiversidade do planeta.
Ela que é pesquisadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Áreas Úmidas (INAU) e do Centro de Pesquisa do Pantanal (CPP), que são parceiros da Wetlands International Brasil e Mupan – Mulheres em Ação no Pantanal e, com todo seu conhecimento de causa complementa, “A torneira que você abre, o banho que toma, tudo entra no ciclo hidrológico e as áreas úmidas exercem um papel nisso. Elas são esponjas que absorvem a água da chuva, o que evita enxurradas e depois solta, por vias subterrâneas, alimenta os rios, os lençóis freáticos e que servem na captação de água às cidades, ao agronegócio”.
Não à toa que elas são frequentemente chamadas de “rins da terra”, pois auxiliam na regulação das águas e ainda ajudam a retardar os efeitos do aquecimento climático por ser capaz de absorver até 50 vez mais carbono do que as florestas tropicais.
Pontos esses que são mais do que o suficiente para explicar a criação do Dia Mundial das Áreas Úmidas. Data que marca a adoção da Convenção sobre Áreas Úmidas ocorrida em 2 de fevereiro de 1971, mais conhecida por “Convenção de Ramsar” – uma referência a cidade iraniana de mesmo nome onde o tratado foi criado.
Sítios Ramsar
Ao aderir à Convenção, os países têm de designar ao menos uma área úmida de seu território como um local de preservação, denominados Sítio Ramsar. Atualmente, o nosso País possui 27 áreas úmidas sob esse título, inclusive locais dentro da maior área úmida do planeta: o Pantanal.
Hoje, são mais de 150 países que assinaram a convenção que visa promover conservação das áreas úmidas, espaços vitais ao equilíbrio ecológico por combater os efeitos do aquecimento global, regular o ciclo da água e, consequentemente, aumentar as chances de migração forçada, os denominados refugiados climáticos.
“Mas, muitas das vezes somente pensamos o Pantanal como uma área úmida. E, qualquer brejo perto de você, regiões de nascentes nas cidades, pequenos córregos, se ficar enxarcada uma vez ao ano pode ser considerada uma área úmida. Não precisa estar sempre inundada, basta um período que tenha a presença de água”, observa a pesquisadora.
No planeta, há 42 tipos diferentes de áreas úmidas, tais como: pântanos, igapós, veredas, turfeiras, charcos, manguezais, recifes de corais e até locais muitas das vezes impensados como lagoas, viveiros de peixes, arrozais, ou seja, áreas naturais [ÁG1] ou artificiais criadas pelo homem.
E se parecem pequenas no tamanho, por representar apenas 6% da superfície da Terra, isso muda em termos biológicos, porque elas são responsáveis pela sobrevivência ou reprodução de cerca de 40% de todas as espécies de plantas e animais que existem no mundo. Só no Pantanal há mais tipos de peixes do que nos rios de toda a Europa.
“A região amazônica tem várzeas, igapós. No litoral, os corais e os mangues são habitats dos camarões e caranguejos, famosos na alta gastronomia”, lembra Cátia que, em termos de áreas úmidas, indica cenários ainda mais familiares, “Em Campo Grande, por exemplo, todo mundo é fascinado pelas araras, aves que dependem muito dos buritizais para viver”.
Sinal de alerta
Entretanto, nem tudo é abundâncias nesses lugares. O Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), aponta que as áreas úmidas estão desaparecendo até três vezes mais rápido que as florestas tropicais, o que explica a necessidade da “Década de Restauração 2021/2030” criada pela Organizações das Nações Unidas (ONU).
“As datas são marcos educativos para que possamos mudar nossa postura, desconstruir padrões. Com imagens equivocadas impostas no passado, muitas vezes por filmes de Hollywood que mostravam as florestas inundáveis da Flórida como cenários de monstros ameaçadores, isso ajudou a criar uma imagem negativa às áreas úmidas que precisamos reverter “, argumenta Cátia.
Trajeto árduo, porém, não impossível aos olhos da pesquisadora. Ela que, no último ano, inclusive, ajudou a organizar o livro “Pantanal às margens da Lei: Panorama das Ameaças e Perspectivas para a Conservação” junto de outros dois pesquisadores. “Com uma linguagem simples, o livro pode servir aos gestores políticos nas tomadas de decisões e dar mais visibilidade ao Pantanal, que não pode ser drenado e que ainda não tem uma legislação”, específica.
Pontos que reforçam a real importância do Dia Mundial das Águas. “Precisamos apostar na educação ambiental para garantir a conservação. Visitar, fotografar uma área úmida ou mesmo tirar lixo da beira de rio. Toda ação é válida para celebrar a data”, conclui Cátia.
Assessoria.